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Todas as vezes que ocorrem homicídios com o envolvimento
de adolescentes reacende o debate acerca da redução da maior idade
penal. As vozes rancorosas dos popularistas penais ecoa em generosos
espaços da grande mídia bradando pela redução da maior idade penal como
sendo a salvação para a barbárie brasileira.
* Pedro Montenegro, da Carta Capital
Ensina o festejado professor Eugenio Raúl Zaffaroni que o
popularismo penal é uma demagogia que explora o sentimento de vingança
das pessoas, mas, politicamente falando, é uma nova forma de
autoritarismo. A violência aumenta porque aumentou a miséria. Os anos
1990 foram os anos do festival do mercado: os pobres ficaram mais pobres
e alguns ricos, nem todos, mais ricos. Os mesmos autores dessa política
de polarização da sociedade são os que hoje pedem mais repressão sobre
os setores vulneráveis da população. Querem mais mortos e, entre os
infratores e policiais, mais “guerra”. No final, eles são invulneráveis a
essa violência. A “guerra” que pedem é a “guerra” entre pobres e/ou
contra os pobres.
Os males do popularismo penal são devastadores na vida
social. O renomado professor Celso Fernandes Campilongo chama atenção
para estes malefícios: “o popularismo penal aumenta o descrédito da
população nas instituições e na possibilidade de mudança em curto prazo,
fomentando a criação de ‘Estados Paralelos’, aumentando e fortalecendo
organizações criminosas, multiplicando a justiça ‘pelas próprias mãos’,
desfazendo a mobilização dos movimentos sociais e desarticulando os
mecanismos de resistência a miséria, entre outros. O que, também
acarreta na utilização do Direito Penal por políticos que hipertrofiam o
sistema penal com soluções aparentemente eficazes em curto prazo, como
forma mais econômica e demagógica de dar uma resposta estatal ilusória
ao problema da delinquência.”
Os popularistas penais, tais como os abutres,
aproveitam-se dos cadáveres das vítimas, aproveitando-se da dor, da
revolta e do sofrimento das suas famílias para defenderem soluções
milagreiras, mágicas e que, se adotadas, não teriam nenhuma eficâcia
repressiva.
Eles sabem e fingem não saber que o Direito Penal,
exclusivamente, não desempenha nenhuma função motivadora de respeito à
norma. E, ainda, que a função do Direito Penal em sociedades
democráticas é conter o poder punitivo. Escamoteiam a óbvia constatação
científica de que, em sociedades complexas, há instâncias que
desempenham importantes papeis de controle social, ainda que de modo
informal, como a família, a igreja, a escola, os meios de comunicação,
entre outras.
A proposta da redução da idade penal é uma das atuais
pérolas do popularismo penal brasileiro, cuja realização no presente
quadro constitucional brasileiro é impossível. Na Constituição Federal, a
inimputabilidade do menor de 18 anos é um direito individual do
adolescente, sendo, portanto, cláusula pétrea que não pode ser abolida
por emenda constitucional, tendo em vista o disposto no art. 5.º, § 2.º
combinado com os artigos 60, § 4.º e 228 da Constituição Federal.
Outra propaganda enganosa, bem ao gosto dos popularistas
penais na defesa da redução da idade penal, é a de que não existe
justiça para os menores de 18 anos que cometem crimes, imperando, assim,
a impunidade. Essa falácia foi refutada de modo inquestionável pela a
Promotora de Justiça da Infância e da Juventude Beatriz Regina Lima de
Mello, ao demonstrar que, se tomarmos como exemplo os maiores de idade
que cometem crimes dolosos contra a vida, que vão a júri popular, como
os homicídios: 50% deles são absolvidos e, dos que são condenados, a
pena gira em torno de 9 anos de prisão.
Se considerarmos que, cumpridos 1/6 da pena, poderá
haver a progressão de regime, então, após um ano e oito meses em regime
fechado, o condenado poderá ser colocado em liberdade. Enquanto que, por
outro lado, os homicídios praticados por adolescentes têm um índice de
condenação superior a 80% e a manutenção dos mesmos em regime fechado
dificilmente é inferior a 3 anos.
Nesse sentido, o mestre Beccaria, lá no século XVIII
escreveu com maestria: Um dos maiores travões aos delitos não é a
crueldade das penas, mas a sua infalibilidade (…). A certeza de um
castigo, mesmo que moderado, causará sempre uma impressão mais intensa
do que o temor de outro mais severo, aliado à esperança de impunidade.
*Pedro Montenegro é advogado especializado em Direitos Humanos e consultor em Políticas Públicas de Segurança Cidadã e Direitos Humanos